Sunday, July 25, 2010

Auto descoberta domingueira


Domingo lindo, ensolarado, azul. Na mesa da sala dou uma olhada no to do list de hoje... Mando uma mensagem pra Gabi, e deixo o resto pra mais tarde.

Começo o dia de um jeito simples, com uma salada de frutas colorida feita ontem. Resolvi deixar a cama desfeita. Temperatura amena, perfeita para dar uma caminhada no parque aqui perto de casa. Quem sabe, sentar sob uma árvore e ler meu livro ou dar uma cochilada?

Começo a trilha que dá a volta no parque. São 4.5 kilometros pela mata frondosa, árvores centenárias, samambaias verdíssimas, esquilos e passarinhos. Como ainda era meio cedo, caminho por teias que as aranhas teimam em tecer pela trilha durante a noite.

Me disseram que, em alguns lugares, havia muitas framboesas maduras. Saio a cata das frutinhas na primeira oportunidade e com isso saio da trilha. Tranquila, pois afinal passeio por esse parque desde que me mudei para esse bairro há três anos. Os passos dos corredores, dos velhinhos, das crianças, dos cachorros vão sumindo na mata. Que delícia!

E, feito criança encantada em corpo maduro, percebo que estou fazendo o que sempre faço: saio da trilha, buscando isso ou aquilo e, em pouco tempo, estou pateticamente perdida em terreno conhecido. Isso acontece sempre: quando dirijo, quando ando, quando visito, quando exploro, quando dou a volta no quarteirão. Uma amiga diz que sofro de dislexia de orientação.  Já me ensinaram um milhão de vezes como me orientar pela posição do sol, e aqui todas as placas se referem ao sul, ao norte, ao leste ou oeste. Acho que vou morrer sem aprender essa lição básica. Hoje fui seguindo os sinais das framboesas e, em pouco tempo, não tinha a menor idéia de onde estava. Olhei pra copa das árvores procurando o sol, tentando lembrar as lições básicas. Uma vozinha na minha mente dizia que tudo estava tranquilo, era só seguir a trilha estreita que eu chegaria em algum lugar. “Afinal”, dizia essa minha vozinha tão conhecida, “você só está fazendo um desvio”.

De fato, uma hora e meia depois e juntas bem doloridas, chego à trilha principal. Na verdade, numa encruzilhada, com placas em todas as direções (que não me dizem muita coisa). 

Ando mais uma hora, dessa vez sem sair da trilha que faz um loop pelo parque e chego ao meu destino, finalmente. Pois é, o destino acabou sendo meu carro que me levaria pra casa. O cochilo sob a árvore vai ficar para outra vez.

O fato é que, apesar de todas as placas, mapas, trilhas bem estabelecidas, de todos os sinais naturais, da posição infalível do sol, eu sempre acabo me perdendo... e me achando. Hoje, revivi a metáfora no Discovery Park.

PS Chego em casa sem as framboesas, mas com vontade de contar essa história...

Saturday, May 8, 2010

Sol dá bobeira



É curioso que bastam dois dias ensolarados em Seattle e me esqueço dos quase 9 meses de frio e céu cinzento que tanto deixam as pessoas abatidas nessas terras do norte.

Sol em Seattle é um convite aberto para preparar alcachofras assadas, retornar ligações, comprar aspargos e melancia, abrir as janelas e sair dançando uma salsa pela sala. Fazer salada com salmão defumado dessas águas gélidas.

Dia de sol é dia de acordar cedo, fazer uma caminhada, dizer bom dia aos vizinhos. Pegar uma aulinha de dança afro, rolar de rir com outras pessoas acertando e errando os passos. É dia de caminhar bem devagar pra prestar atenção às flores e folhas novinhas que se preparam pra maravilhosa orgia da primavera.


Dia de sol em Seattle é dia de ver gente feliz, braços de fora, cachorro na coleira, preparando piquenique no parque ou na praia. Tudo fica simples, colorido, fácil, engraçado. Os mais saidinhos saem fantasiados de vaso, pirata, dançarina. Outros, mais radiciais, ainda pegam prancha ou ski no resto de neve nas montanhas. Tem gente que pesca nos lagos urbanos, que de peixe nada tem... ficam lá, tomando sol olhando o anzol, encantados. Os primeiros dias de sol aqui dão uma certa bobeira. Bobeira boa, encantada.

Por serem meio raros por aqui, os dias de sol puro e céu azul são como dias de dar e receber presentes.

Monday, May 3, 2010

Esperando milagres



 O gato da Gabi, que ainda mora comigo, tem a mania de brincar e subir nas cortinas quando eu fico fora de casa por muito tempo.

Voltei esta tarde pra ver que as duas cortinas da sala tinham desabado.  Pano e varas espalhados pelo chão. O gato, satisfeito, dormia nos panos.

Olhei os buracos dos parafusos na parede e saquei logo que eu precisaria de uma furadeira – e know-how pra fazer o treco funcionar . Não tenho nem um nem outro. Confesso que tive um lampejo melanino de esperança: talvez se eu lavar as cortinas a questão do buraco na parede se resolva por si só. É um jeito estranho é  de procastinar.

Olhei para as cortinas no chão com desânimo. Tirei todas as argolas e pus as cortinas na máquina de lavar. Pelo menos tenho uma máquina de lavar e paciência para costurar as argolas de volta.

De manhã, entro na sala e lá estão as cortinas limpas e a parede esperando os parafusos e os suportes. A luz do sol entra iluminando tudo. Bem bonito. Resolvo sair e deixar o assunto cortina para outra hora. Quem sabe quando eu voltar elas estejam recolocadas...por um anjo, talvez?

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 Pois, é... acabei arrumando as cortinas sozinha. Mas um anjo me emprestou uma furadeira! Adquiri o know-how na marra mesmo.

Tuesday, April 20, 2010

trabalho de formiga no mundo global


Há um mês, acidentalmente, consegui um trabalho novo. Um trabalho de tradução/revisão do sistema operacional das máquinas de ultrasom de uma empresa líder do mercado. Digo acidentalemente porque acho mesmo que eles não conseguiam achar alguém com o meu perfil na região de Seattle. Por perfil quero dizer muita paciência. Aceitei mais por ser um trabalho frila de longo prazo, com bastante flexibilidade  e bem pago.

Na primeira vez que fui ao “laboratório” da companhia, fui treinada por uma tradutora italiana sênior. Nosso supervisor era um coreano jovem, impaciente do tipo que cronometra o progresso (lento, no meu caso) durante as 8 horas precisas que temos que estar trabalhando no projeto. Nem um minuto a mais, nem um segundo a menos. As máquinas de ultrasom onde trabalhamos também nos cronometram. São duas máquinas idênticas: uma - dessa mesmo que o pessoal usa nas clínicas e hospitais - toda programada em inglês. A outra, programada em português.

O trabalho consiste em verificar se cada janelinha, botãozinho, instrução, comando, etc., está corretamente traduzido. Muitas das pré-traduções foram feitas por tradutores na Europa, no Brasil, na China e nos sites/programas de tradução. Samba do criolo doido... cronometrado.

Esta semana minha supervisora é uma jovem chinesa, que mal fala inglês. É a segunda vez que ela vem para os EU para supervisionar o trabalho da equipe de tradutores espanhois, portugueses, franceses, italianos, dinamarqueses, japoneses, coreanos, entre outros.

Sim, ela mal fala inglês e é bem difícil entender o que ela diz. Deve também ser difícil para ela entender o que eu digo... primeiro, porque eu sou nova no projeto e tenho montes de perguntas bem básicas; segundo, porque eu uso um PC e ela usa um não sei o quê chinês... e as máquinas não se comunicam; terceiro, porque tem uma onda de fofoca no ar que eu não consigo decifrar. Só aos poucos, no restaurante da empresa, ou nos corredores, vou aprendendo as nuances e politicagens.

As 9 da manhã, 30 minutos depois do cronômetro começar a ticar, aprendi rapidinho que ela pode não falar nenhuma língua além do mandarim, mas ela conhece o programa que temos que verificar de olhos fechados. Ela disse que o software foi feito pela empresa chinesa e ela é uma das engenheiras de programação. Perguntei seu nome... ela disse que nos EU se chamava Sunshine.

Passei o resto do dia, perguntando, checando, me confundindo com os comandos em todas as máquinas... com muita paciência, Sunshine foi me iluminando. Nem percebi que o cronômetro ticou exatamente as 5 da tarde.

Sunshine foi para o hotel, jantar provavelmente com um dos diretores chineses do projeto. Eu voltei pra casa, curti o gato, fiz jantar e vou assitir Viver a Vida.

E me sinto feliz por trabalhar para uma empresa desse porte sem precisar estar emaranhada nos fios e tecidos humanos do dia-a-dia. Ao mesmo tempo fico um pouco frustrada em ser uma terceirizada que não consegue entender quem é quem na trama... um dia recebo tarefas do escritório no Colorado, outro dia preciso mandar relatório para Seattle com autorização assinada na Irlanda, outro dia devo pedir senhas para Beijin...

Bem, são esses os relatos de uma mulher mais ou menos jovem caída, sem querer e assim mesmo grata, nas redes globais...

Monday, April 19, 2010

Cinema e pipoca


E era nada de nem noite de negro não
E era nê de nunca mais
E era noite de nê nunca de nada mais
E era nem de negro não
Porém parece que hágolpes de pê, de pé, de pão
De parecer poder
(E era não de nada nem)
Pipoca ali, aqui, pipoca além
Desanoitece a manhã
Tudo mudou
(Caetano Veloso)

... tenho uma amiga com quem vou ao cinema umas duas ou três vezes por mês. Somos o que aqui se chama de ‘movie buddies’... Um programa bem singelo: uma caminhada, um filminho e um jantar.

Na maior parte das vezes jantamos num lugar onde pedimos ‘tapas to share’ – pequenas porções de comidinha mediterrânea: um pouquinho de salada de lulas, um outro pouquinho de azeitonas, uma pratinho de bolinhos de carne com um tantinho de arroz com açafrão. Tudo por menos de $20, fraternalmente compartilhado, já que estamos as duas vivendo com nossas restrições orçamentárias pessoais.

As vezes, quando a situação pessoal esquenta ou a fofoca da semana  convida, tomamos alguma coisa mais potente. Nessas ocasiões, ela pede um manhattan, e eu fico no vinho branco mesmo.

Ontem, o programa da caminhada antes do filme foi pro brejo, por causa da chuva de Seattle. Nos encontramos no cinema pra ver um filminho bem nada a ver: Date Night.

Dessa vez, enquanto me vestia e secava meu cabelo, resolvi fazer pipoca em casa. Eu não queria pagar $5 por um saco de pipoca comprado no cinema.  Esquentei um pouquinho de óleo de canola com um outro tantinho de manteiga, um tiquinho de orégano, joguei os grãos de milho... em menos de cinco minutos estava eu com dois super sacos de pipoca amanteigadas e deliciosas. Ah, o milho da pipoca, diz a embalagem, é orgânico. (Me pergunto como sementes de uma grama pode não ser orgânico??? Fica pra outra vez.)

Bem, no saguão do cinema encontrei minha amiga já na fila da pipoca. Eu disse a ela que eu tinha pipoca feito em casa, fresquinha, na manteiga. Ele me olhou surpresa, com olhos esbugalhados, e foi pedindo a pipoca da lojinha de porcaria. A meia voz, sussurrando mesmo, ela me disse que não se pode trazer comida de casa ao cinema. Se quizermos comer ou beber, precisamos comprar da lojinha. O olhar dela era de tanto espanto, que nem percebi quando joguei meus saquinhos de pipoca caseira dentro da bolsa.

Na bolsa, eu carregava também uma garrafinha de água de torneira da minha casa. A água de torneira aqui é bem potável e não há razão para comprar água mineral – que, de qualquer modo, deve sair das torneiras da Coca-Cola sabe-se lá da onde.

Bem, aprendi que não podemos levar a nossa água, nem pipoca, nem nada pra dentro do cinema...  Precisamos comprar tudo na lojinha. Somando o ingresso de $10 mais os $ 5 da pipoca mais os impostos,  já pagaria um bom jantar.

Bem, essa experiência toda deve ter durando uns dois minutos. Acabei entrando com a minha garrafinha de água, meu saquinho de pipoca feita em casa, pra ver um filme bem desprezível. Depois, minha movie buddy e eu acabamos a “noitada” num sushi bar ao lado do cinema.

Gente... ou estou dura, ou caindo na real da vida americana ou ficando velha e sovina. Ou, aprendendo a ser mais simples e a curtir as tardes de sábado com uma amiga, vendo filmes e fazendo fofocas gostosas e nada a ver.

Ela voltou pra casa pra continuar a caça de ‘parceiros’  nos sites que ela tanto gosta. Eu, pra terminar um livro e as pipocas.

 ...sábado que vem nos encontraremos pra mais uma rodada. Desta vez, carregando bandeiras e slogans na rua, fazendo passeata e sendo as ativistas tímidas que somos. O nome do evento é compassionate action network Seattle. http://www.compassionateactionnetwork.com/home.asp






Sunday, February 21, 2010

Reflexões de inverno




Este inverno consegui dar umas duas escapulidas. Passei o mes de novembro na Bahia e dez dias no sul do México, em janeiro.

Mas foi nesta manhã ensolarada, descendo pelas ruas floridas de cerejeiras, que me dei conta que andei meio que hibernando esses últimos meses. Foi um inverno suave por essas bandas, sem neve nas ruas, nem tormentas, nem grandes desastres. Pra mim, foram meses cuidando da minha saúde.

Não vou entrar nos detalhes, mas um dos sustos foi que vi (os médicos me disseram) que eu preciso tomar mais cuidado com o meu sistema circulatório. Generalizo assim, por causa do colesterol e pressão alta.

Com esses cuidados preventivos tenho aprendido um monte de coisas:

Sim, é possível passar um mes na Bahia comendo saudavelmente nos quilos. (Claro, não há comidinha melhor do que na casa do papai, mas meu trabalho com o Bahia Street me leva pra longe, reconcavo adentro.) Basta escolher entre uma moqueca de peixe e uma colherada de couve! Simples assim! Entre os bolos e as bananas fritas do café da manhã e meio mamão.

Aprendi também que preciso ser firmona comigo mesma quando o assunto é exercício. Agora, não tem espaço de negociação... Entrei numa academia, e... tá bom, não malho nas máquinas... faço pilates e ioga cinco dias por semana. A opção academia acaba sendo mais em conta do que fazer os cursos por fora. Na  saída da academia, todas as manhãs, olho pras geringonças e penso... amanhã te encaro. Mas o fato é que não falto as aulas. Pensei que fosse emagrecer e ficar bem gostosa. Nada disso. Estou mais forte e flexível. A pele também melhorou... acho que de tanto transpirar. Mas o peso continua o mesmo... e o ser gostosa? Ai, não cabe a mim dizer...

Uma outra coisa que aprendi foi a importância do No-how.

Sim, aprender a dizer não. Não pra amigos deprimidos; não pras ONGS pedidoras de milhares de dolares dos outros e que não pagam nem uma dezena aos voluntários; não pros malas que aparecem com filhos, ex-mulheres, dívidas e outras coisas mal resolvidas; não pra minha preguiça em dias de chuva; não pro gato fujão que agora é meu; não pra quem chora e quer dinheiro emprestado e não sai à luta; não pra essa idéia que a gente tem que ter uma missão na vida e que é preciso mudar o mundo.

Neste final de inverno estou mais tranquila. Não vou mudar o mundo, mas faço o que posso e consigo. Esse meu coração mole não vai mais ser explorado. Aceito a minha escolha de estar aqui, no nortíssimo dos EU, com seus lagos, suas chuvas, sua brancura, seu verde, sua diversidade, alguns poucos mas valiosos amigos, (esse gato que começo a amar). Aceito a minha idade. Meu jeito. Minhas complicações. Meus amores perdidos. Meu jeito de ser. Aceito desafios de trabalho enormes desde que façam sentido e gerem recursos.

Esta tarde, reli a dieta que a cardiologista me mandou. Dieta mediterranea: muito azeite de oliva, vegetais, frutas. Bem, tenho seguido essa dieta faz tempo. Mesmo assim, o colesterol continua alto. Vou então seguir a minha dieta paralela de ficar tranquila e ser quem eu sou, ficar longe de baixo astral, da cultura exploratória das ONGs... Agora, o que não está na dieta da cardiologista é o ingrediente fundamental: é preciso regar todas as abobrinhas, azeitonas, beringelas e grão de bico com...

Um amante mediterraneo!

Por que será que os especialistas de saúde esquecem do fundamental?  Aqui nos EU café, amor, tesão, risos, preguiça, abraços, beijos, vinho, curiosidade, bobeira, palavrão,  são vícios... que daqui a pouco poderão ser punidos com chabatadas. Falam tanto das burkas...  


Saturday, November 28, 2009

Lembranças e lições da Bahia



Alguns momentos inesquecíveis vividos durante a minha ida à Bahia com Margaret, seu charmoso monitor acadêmico, o Angelo e 14 alunos da Universidade de Washington:


Eu – Estamos aqui pra te trazer um remédio para sua indisposição. Soubemos que vocês exageraram nas bebidas na festa de ontem a noite.

Aluna (com cara de ressaca) – Obrigada. Sim, a festa estava ótima! Bebemos até quase cair.

Eu – Pra que beber tanto assim?

Aluna (surpresa) – Se não é pra ficar completamente de porre, pra que beber? What’s the point?


***

Antes da viagem, recebi um email me avisando que três alunos estavam fragilizados. Interpretei 'fragilizados' como sendo algo relacionado a uma gripe ou resfriado.

A fragilidade de A era alcoolismo e evidente violência doméstica na infância, ou talvez ainda agora. Meio burrinha mesmo, postou suas estripulias na web. O pessoal da universidade que acompanha o FB dos alunos entrou em pânico pensando que não estávamos supervisionando bem os alunos. Muita areia vai voar ainda por causa dessa garota que, na maior ingenuidade, pode ter prejudicado todo um programa acadêmico maravilhoso.

A fragilidade de B, surtos de depressão. Garoto lindinho, filho de militar evangélico de uma cidade pequena no interior da costa oeste. Na universidade saiu do armário e assumiu novas preferências sexuais. Na Bahia soltou a franga até que outros gays locais o aconselharam a baixar a bola... gay na Bahia tem que ser mais macho.

A fragilidade de C era a mesma da maioria dos outros alunos: jovem em busca de sua identidade, de origem muito modesta, de etnia minoritária e história pessoal complicada.

Mais uma vez a linguagem politicamente correta me pegou... por que não avisar de cara que a turminha daria uma trabalheira danada? Além disso, de frágeis eles não tem nada. São pessoas de muita garra, alguns sobreviventes de atrocidades, passando pela fase de transição entre a adolescência e a vida adulta.
 ***


Aprendi que uma das formas mais legais de aprender sobre a própria cultura é viajar com uma professora e seus estudantes de antropologia.

Cada aluno tinha um projeto de pesquisa. Os temas eram bem diversos: capoeira, candomblé e catolicismo, a influência evangélica na política local, comida de rua e boteco, samba, a vulgarização da mulher nas letras do pagode, influência libaneza na Bahia, a linguagem corporal dos gays, grafite e grafiteiros, a questão das cotas, o papel da mulher nas instituições de ensino, e por aí afora...

Margaret, Rita, Angelo (monitor acadêmico do programa) e eu ajudávamos da melhor forma possível, já que a maioria não falava ou mal falava português. Margaret e Rita procuravam agendar entrevistas com especialistas em cada área; eu traduzia as pesquisas, perguntas e respostas para os alunos mais introvertidos; cada um de nós acompanhou alunos individuais ou o grupo todo em ‘visitas de campo’.

Entre várias outras, as visitas incluiram concertos de música mestiça no Museu do Ritmo em Salvador (tive overdose de música africana!); assistir missas e rituais de candomblé (escapei dessa!); comer comida árabe num restaurante na casa de uma libanesa simpática e falante (essa eu não podia perder!); conversas com professores e professoras; bares gays (eu perdi essa);  aulas e palestras sobre capoeira; visitas e palestras sobre as favelas; conversas com vendedores ambulantes de cafezinho; a imunda mas fascinante feira de São Joaquim.

Novembro foi um mês de muito aprendizado, trabalho, calor, ansiedade e calor humano. Um mês na corda bamba, transitando por nuances culturais, estabelecendo pontes de entendimento. Posso dizer com certeza que, além de ficar perto do fogão fazendo comidinhas, o que mais gosto na vida é de estar no meio da diversidade e aprendendo com todo tipo de gente.