Wednesday, September 23, 2009

Programa legal: ir ao banco

Graças à internet, ir ao banco ficou coisa quase do passado. 99% das transações podem ser feitas em casa, ou pelos sistemas telefônicos do I-phone ou Blackberry ou outros. Logo, logo, as agências bancárias se tornarão obsoletas... aqui, nos estados unidos.

Mas, eu gosto da agência do meu bairro. Passar por lá chega a ser um programa até bem legal. Minhas idas esporádicas são uma imersão na diversidade dessa cidade. E, como agências vão se tornando obsoletas, nunca tem fila. Se tem, em dias de pagamento, é de uma ou duas pessoas.

O gerente geral da minha agência é um carioca simpático que nos recebe com muito sorriso e conversa mole. 

Sempre feliz em poder falar português.  As vezes quebra uns galhos pra Gabi, mas não sei dos detalhes.

Os caixas são três: Uma senhora da Croacia, com quem troco receitas inéditas de todas as variações de iogurte feito em casa e repolho... charutos, sopas, ensopados...

Um outro, Ben, que demorou um tempão pra dizer que era chinês. Eu meio que desconfiava, por causa do sotaque aveludado com toques de brocado. Tinha certeza que ele não era coreano (não cheirava a loção pós barba a base de alho), nem japones (ele te olha nos olhos). Podia ser tailandes, ou vientnamita. Um dia, olhei olho nos olho e fiz a pergunta direta, contrariando todas as regras do politicamente correto – “ de onde você vem, Ben?”.  Vermelho, ele disse que era chinês.


Um garoto americano que tenta, com todos os panos, cobrir as tatuagens feitas em momentos de desvario... Pra conseguir o emprego no banco precisou costurar as orelhas furadas pelos piercings. Vai saber o que ele tem e carrega por baixo da roupa... A gente conversa sobre ser jovem, bares, shows, escolhas e opções de futuro. Futuro na vida pessoal, nunca sobre investimentos.


A gerente da minha conta jurídica não tem muito trabalho comigo. Ela é equatoriana. Não fazemos muitos negócios nem trasações, pois minha situação jurídica é um desastre. Mas gostamos de treinar o nosso portunhol.
E com minhas idas e vindas ao banco já sei falar “oi”, “como vai”, “tenha um bom dia”, “seja bemvindo” em chinês, espanhol, e croata. Ainda estou esperando o jantar prometido pelo carioca.

De qualquer forma, ir ao banco é um programa legal. Aprendo línguas, fico antenada em sotaques e, mais legal ainda... aprendo e vivencio a interação humana pura e simples, sem credo, nem classe, nem cor.

Por isso, escolho viver aqui... aprendo o tempo todo, não tenho medo das pessoas e, melhor ainda, como gente comum, transito livre entre as diverisades e distinções ... pelo menos no dia-a-dia. Nessa minha rotina, a cor da pele e o saldo bancário não afetam o contato humano. Por isso, continuo gostando daqui... cinquentona e aprendendo.







Sunday, September 20, 2009

Em casa...




Meu amigo Bruce foi me buscar no aeroporto, ontem. Estava desconjuntado, com dor nas costas. No micro Maseratti conversível dele, mal cabia minha sacola, muito menos um entalhe pernambucano que servia de mesa em Boiçucanga. Acabei deixando o entalhe no aeroporto, pra buscar depois (hoje). E acabei esquecendo de dar a ele o chocolate que trouxe como agradecimento pela carona/traslado.




Cheguei em casa... tudo limpinho, arrumado e cheio de flores. Carinho da Gabriela. Até cartinha de amor ela escreveu! Gatinho miando, saudoso e carente. Abri a porta da varanda e lá se foi ele pra balada.

As 10 e meia da noite, eu já na cama há tempo, toca o telefone. Meu vizinho, professor de química com jeitão de pardal aloprado, me convidando para comer um stir fry. Declinei ...  pensando que um dia vou precisar retribuir o convite.


Hoje, amanheceu bonito, friozinho. Dou uma checada nas plantas... todas bem felizes. Desfaço a mala, lavo roupa, essas coisas que a gente faz aos domingos.


A mãe do Philippe me ligou pra dar parabéns. Depois de um papo gostoso, eu num francês bem lastimável, desligamos. Gostoso ter essa ligação com ela depois de todos esses anos.

A tarde, festinha em homenagem ao Robert Barclay, mais um dos anjos maravilhosos que apoiam o Bahia Street. Cheguei mais cedo na casa da Margaret, pra ajudar aqui e ali. Enquanto abríamos as garrafas de vinho e suco, arrumando a mesa de sobremesa e limpando uns espelhos, ela foi me contando algumas peripécias da recente viagem que fez à Islandia. Como, por exemplo, passar três dias andando pelos fiordes do norte do país, se afundando na neve e caindo precipício abaixo ... quase morreu. Além de acadêmica, ongueira, aventureira, capoeirista, Margaret é cabra montanhesa.

A festinha foi muito simpática, ensolarada e cheia de comidinhas, algumas gostosas. (Esses “pot lucks” acabam sendo meio desconexos). Rolou até um bolo de aniversário surpresa e um bolinho de mousse de chocolate pra mim! Fiquei emocionada.

E me sinto em casa, feliz.





Brasil me confunde


Na cozinha amarela da rua da Mata, enquanto esperava o taxi pro aeroporto, deixei um recado no facebook dizendo que estava de partida e me sentia um pouco sombria.

Nan, em Salt Lake, sempre amiga, me perguntou o que me deixava sombria... no percurso das duas horas até Guarulhos, fiquei pensando na pergunta dela... a minha conclusão, em trânsito, é bem banal: o Brasil me deixa confusa. Ou, posso estar tendo um ataque de desamor ou carência. Os sintomas são claros:

Amargura...

Estou na minha terra natal há duas semanas. Cada minuto dessa aventura, desse re-encontro, me encanta e desencanta. O alegre e hospitaleiro sorriso brasileiro é muito real e autêntico... O alegre e hospitaleiro sorriso brasileiro é criativo, jeitoso e muito triste. Quase patético, se dermos ouvidos aos noticiários da midia.

Desesperança...

Ano passado, nos orgulhávamos das alternativas sustentáveis... dos avanços modelares no uso de combustíveis alternativos. Hoje, precisamos engolir o pré-sal, o Lula abraçando Collor e Sarney para abrir alas para Dilma.... hoje queremos abraçar Marina Silva, amazonense que rodou a bahiana, quebrou regras e muralhas, abriu novas portas... mas que precisa urgentemente se mudar o visual evangélico para pisar no gramado do planalto decadente e coronelista, ah precisa.

Cinismo...

Sem medo de São Paulo, ando por aí, vendo a miséria urbana de frente ao som alegre do sabiá. (Passei quase dois meses na Bahia vivendo esse mesmo impasse). Sinto uma coisa estranha, sem nome mas impotente, suavizada por um sorriso, uma comidinha e outra, um brilho no olhar, um gesto carinhoso, um abraço...

Ando sem medo, mas tudo parece querer meter medo na gente. O sinistro enjoa.

♦ Motoristas frenéticos apressados (atrás do volante esquecem o que é ser pedestre);
♦ Noticiários nacionais e locais onde a boa notícia é terror e violência... (cadê as coisas maravilhosas que acontecem por aqui?);
♦ Minha bolsa é amarrada à cadeira num restaurante nos jardins onde, só na entrada, passo por no mínimo tres seguranças enormes (me disseram que faz parte do atendimento ao cliente);
♦ A empresa onde minha amiga trabalha paga taxi aos funcionários que precisam trabalhar hora extra a noite;
♦ Falei com pessoas que, por precaução, não aproveitam os diversos eventos culturais noturnos da cidade (falei com outras que curtem a vida noturna... Ufa!)
♦ Minha irmã quase teve uma síncope quando teve que ficar cinco minutos dentro do carro parada na rua;
♦ Beijar filha de pele escura dá cadeia, e ser pedófilo de 78 anos, não;
♦ Contar que meu prédio em Seattle não tem porteiro, nem tranca, nem segurança, nem vídeo causa espanto em alguns paulistas.

Agarrando os salva-vidas...

Mas nem tudo é como o mundo cão que a mídia gosta de mostrar...

♦ uma centena de meninas em Salvador comeram hoje graças a duas mulheres e suas turmas engajadas;
♦ ainda enconta-se verduras e frutas simples e deliciosas... com sementes até!
♦ minha irmã re-descobriu o amor;
♦ artistas deixam suas marcas nas paredes, nas escolas, no facebook, nas almas dos interlocutores;
♦ pessoas leem livros nos ônibus apinhados;
♦ sobrinhos começando suas trilhas pessoais;
♦ novas e gostosas amizades em sampa feitas nos EU via amazônia brasil;
♦ um ex-marido agora amigo dos mais queridos;
♦ a gentiliza das pessoas na rua;
♦ o sorriso desdentado do padeiro
♦ ... e o sempre alegre sabiá.

Ai, ai... o Brasil sempre me deixa um pouco confusa.